O texto abaixo é a tradução, feita pelo Irmão Arnaldo Mário Hillebrand, de uma mensagem do nosso Superior Geral Irmão Álvaro Rodríguez Echeverría a Religiosos e Religiosas (Ele foi o presidente da USG - União dos Superiores Gerais, durante vários anos). No dia 16 de agosto, domingo, comemora-se a solenidade da Assunção de Maria Santíssima, o mais novo dogma proclamado pela Igreja. É também o Dia dos Religiosos e das Religiosas, no mês das Vocações. Acreditamos que esse artigo possa servir para reflexões de todos que acreditam que Deus nos chama à vida e nos dá uma vocação.
Maria, mulher do povo, simples e humilde, vive sua consagração a Deus atenta à realidade, próxima a seu povo. João Paulo II, aos religiosos e religiosas, expressou isto assim, em Caracas: “Na Virgem do Magnificat há duas maravilhosas fidelidades... Uma fidelidade a Deus e ao projeto de amor misericordioso dEle, e uma fidelidade ao povo de Deus. Sede vós, também, fiéis a Deus e a seu projeto. E sede fiéis ao povo de Deus!” (Caracas, 28 de janeiro de 1985). Nós somos convidados para isto!
Maria Santíssima em nossa vida espiritual
Ela nos faz descobrir o valor, muitas vezes esquecido, do feminino. Maria aparece, sobretudo, como sacramento da ternura maternal de Deus.
Nossa sociedade está padecendo de uma mudança de centro de gravidade. De uma sociedade baseada no predomínio do masculino e da racionalidade, se está passando para uma sociedade centralizada na pessoa e no equilíbrio de suas qualidades.
Nossa fé concentrou em Maria a plena realização do feminino. Em Maria, o feminino aparece como caminho para Deus e revelação de Deus, porque, como afirmava João Paulo I: “Deus é Pai, mas sobretudo é Mãe”.
Por isso podemos dizer que as raízes do feminino se perdem em Deus, e Maria é a revelação, o sacramento, a antecipação escatológica de tal mistério de ternura. Aproximar-nos de Maria é conhecer melhor o ser de Deus.
O feminino nos faz ver o ser humano em outros termos. Até agora o mundo esteve mais fortemente marcado pelo masculino, a racionalidade, a força, a eficácia. Hoje estamos vivenciando os resultados desta maneira de ver. Neste contexto aparece o feminino como possibilidade de outra óptica marcada por relacionamentos mais fraternais, de mais ternura e solidariedade, mais contemplativos e em comunhão com a terra. A “Conferência de Pequim” (1) pôs em destaque muitos destes valores e, alguns dias antes, o Papa João Paulo II, afirmara que são os homens, e não as mulheres, aqueles que decretaram e realizaram as guerras, e, na alocução do “Ângelus” deu mostras de estar admirado pelo enorme enriquecimento de que a Igreja usufruirá quando a mulher puder desenvolver nela suas potencialidades.
Mas, Maria Santíssima não apenas se revela como ideal da mulher, mas de todo ser humano. Porque se Maria é a Mãe Puríssima, a Mãe Amável, a Rosa Mística, a Estrela da Manhã (qualidades femininas), Ela é também a Torre de Davi, o Espelho da Justiça, (atribuições masculinas).
Em segundo lugar, Maria é o ideal do ser humano: convite para vivenciar e redescobrir o valor do feminino em nossa pessoa e em nossa cultura. Nosso santo Fundador pessoalmente nos convida a isto, quando nos pede que unamos à firmeza do pai a ternura da mãe. E este aspecto simbólico não deve fazer que percamos o lado histórico de Maria, porque Ela também foi uma aldeã, a esposa do carpinteiro José, a virgem mãe do também carpinteiro Jesus, a mulher atenta às necessidades dos outros, a mulher forte ao pé da cruz, a mãe jubilosa do Ressuscitado, a companheira dos apóstolos no Pentecostes.
Neste sentido, no Documento de Santo Domingo é asseverado: “Maria, a mulher solícita ante a necessidade surgida nas bodas de Caná, é modelo e figura da Igreja em face de toda e qualquer forma de necessidade humana (cf. Jo 2,3ss). Como a Maria, Jesus recomenda à Igreja que se preocupe pelo cuidado maternal da humanidade, sobretudo daqueles que sofrem” (cf. Jo 19,26-27).
Por isso, Maria é também a esperança do povo. Esperança e causa de sua alegria. Seguindo neste ponto o Irmão Noé Zevallos, podemos dizer que, em Maria, nos é possível encontrar tudo aquilo que desejamos ser. Queremos ser pessoas, livres, construir um mundo isento de egoísmos, estar do lado dos pobres e inspirar-lhes esperança. Maria realizou tudo isto integrando as tensões mais dolorosas e os conflitos com sua visão clara da Vontade de Deus. O Papa Paulo VI escreveu:
“Para o homem contemporâneo, - não raro atormentado entre a angústia e a esperança, prostrado mesmo pela sensação das próprias limitações e assaltado por aspirações sem limites, perturbado na mente e dividido em seu coração, com o espírito suspenso perante o enigma da morte, oprimido pela solidão e, simultaneamente, a tender para a comunhão, presa da náusea e do tédio, a bem-aventurada Virgem Maria contemplada no enquadramento das vicissitudes evangélicas em que interveio e na realidade que já alcançou na Cidade de Deus, proporciona-lhe uma visão serenadora e uma palavra tranquilizante: a da vitória da esperança sobre a angústia, da comunhão sobre a solidão, da paz sobre a perturbação da alegria e da beleza sobre o tédio e a náusea, das perspectivas eternas sobre as temporais e, enfim, da vida sobre a morte” (Marialis cultus, 57).
E, se Maria acompanhou Jesus nas alegrias (Caná), sem esquecer as expressões populares de fazer festa e recrear-se, também o acompanhou ao pé da cruz, depois de quase todos terem fugido. “Junto à cruz, Maria representa a dor da humanidade. Diz o profeta: Tua dor é profunda como o mar. - A pessoa que vive na dor, que participa dessa herança cruel da humanidade, encontra na Virgem Maria um modelo operativo para suportar a aflição e não sucumbir em face da angústia... E, nessa sexta-feira santa da humanidade, Maria ao pé da cruz, esperando contra toda esperança, representa a imensa e inesgotável confiança dos pobres” (Irmão Noé Zevallos).
O “Sim” de Maria e nossa Consagração
e dar-lhe graças por todas as suas liberalidades.
Já então, consagrou-se totalmente a Ele,
para não viver, nem ter no resto de seus dias,
vida nem movimento, que não fossem do agrado dEle.
Humilhou-se profundamente no íntimo de sua alma,
reconhecendo que tudo o que nela se operava era devido a Deus.
Admirava em seu interior o que Deus operara nEla,
e dizia a si própria, o que depois publicou em seu
Cântico: Deus fez em mim maravilhas!
Olhando para dentro de si, e contemplando Deus morando ali,
maravilhada pela profusão com que o Criador
se havia derramado em sua criatura,
aceitou e se convenceu de que tudo nela
devia prestar tributo, honra e glória a Deus...
Se a Virgem Maria recebeu tal abundância de graças,
foi para que tornasse partícipes delas
todos os homens que recorrem à sua proteção...”
(Med. 163,3 – parafraseada pelo Irmão Noé Zevallos)
O santo Fundador, a partir de Maria, também nos sugere outra maneira de vivenciarmos nossa consagração: estar abertos à Palavra, para poder comunicá-la aos outros, e assim sermos tabernáculos do Verbo de Deus, sacramentos de sua presença, assim como foi Maria:
Maria, esperança do povo, dá-nos um coração sensível à dor e à pobreza; às necessidades das crianças, dos adolescentes e dos jovens que educamos. Ensina-nos a ler sinceramente o Evangelho de Jesus e traduzi-lo em vivência, no espírito radical das bem-aventuranças, e no risco total daquele amor que sabe dar a vida por aqueles a quem ama.